E assim, sob um Tímido Sol do meio dia, pois o céu nublado abrira espaço para que o Astro Rei se apresentasse, adentramos ao Velho Bosque de Arbustos, Espinheiros, Carvalhos, Secóias, Sorveiras, Faias, Coníferas e Caducifólias, de arvores frutíferas, pouco se via. Com passos firmes e cuidados abrimos caminho partindo trepadeiras e o mato alto que recobria a estreita trilha, a muito não usada.
Para Violett era tudo novo. Vivian e eu trocávamos olhares e sorrisos de
Alegria, admirando a perplexidade com que nossa Filha fitava, boquiaberta, o
“novo mundo” de tons desbotados, sons diversos e fragrâncias distintas que a
nós se abria, envolvendo-nos a medida em que avançávamos. Parecia dedicar
atenção a cada arvore, atenta a todos os “pios, coaxos, uivos e sons e cantos
de pequenos insetos. Faceira, apontava para todo e pequeno animal ou
pássaro que fugia ou se entocava assustado com a nossa ruidosa passagem. Nossa
lobinha, Foxy, dormia, mesmo com o balanço irregular de nossa carroça. Vivian,
sentada também sobre o carro entoava antigos cantos à Natureza enquanto fazia
finas tranças nos cabelos de Violett.
Durante um período de poucas chuvas levaríamos cerca de quatro horas de
caminhada até a estrada principal, cruzando o largo rio. A Forte Chuva e
Tempestade desta temporada tornava dificultoso nosso caminho, pois, as chuvas
favoreceram ao crescimento de mato sobre a trilha e a tempestade quebrara
galhos, derrubara troncos podres e espalhara tudo. Ao que me parece, levaríamos
muito mais tempo, serpenteando, cruzando por troncos caídos, pedregulhos e
lamaçais, ainda enfrentando subidas e descidas até que chegássemos ao Largo
Córrego. Estávamos juntos, o que é o mais Importante, se necessário passaríamos
a noite na cidade, contrariando a minha vontade, pois, temo que muitas coisas
tenham mudado nas cidades e que já não haja mais lugares Calmos e Pacíficos.
- Rafa!? Me preocupa que tenhamos de deixar a Segurança de nosso Lar, para
entrar na agitação da Cidade. Por lá, há aqueles com o Desejo de Barganha sobre
os demais. Há Violência... Também, não precisamos tanto assim de algo que
provenha das cidades.
Vivian, assim como eu. Sentia as Mudanças que estavam acontecendo. Me pus a
simplesmente ouvi-la.
- Sabe. – Continuou- Sinto que... Estes sejam Tempos Difíceis. As noites tem
sido cada vez mais Longas e Escuras, e não me diga que se trata do prenuncio do
Inverno... Eu Vejo... E vejo que você também teme que em breve não existam mais
locais Seguros.
Conhecendo bem sua Sensibilidade, não deveria deixar-lhe sem resposta sobre
seus Pensamentos, Temores e Pressentimentos.
- Vivi... Nem tanto por nós, minha Amada, mas... Podem estar precisando de
ajuda pela Cidade ou Vilarejos. E, somente se tivermos Conhecimento de como
anda a Situação por lá, é que poderemos melhor nos preparar e proteger. Nossa
pequena esta crescendo rápido, é Importante que Conheça a Realidade do Mundo lá
fora (...), A Fome, o Medo, a Violência... O mundo tornou-se em um Campo de
Predadores... A Ingenuidade pode lhe ser Danosa, mas sua Pureza não se perderá.
Não posso dizer que trouxe mais Tranquilidade e Segurança à Vivian, mas, pude
perceber que sentia-se melhor por ouvir meus medos.
Com três horas de viagem, Violett adormeceu. Não chegamos ao fim de nossa
jornada, mas estávamos muito próximos ao meio do caminho. Sinal disto era o
audível som e o frescor do Córrego que teríamos de cruzar. Tudo transcorria
bem, de forma tranquila, embora não facilitada.
Árduo era nosso percurso. O peso de nossa carga fazia com que as rodas de nosso
carro fizessem profundos sulcos na lama, atrasando-nos ainda mais. Foxy, preguiçosa,
embora acordada permanecia quieta e deitada. A fim de contribuir para nosso
progresso, Vivian desceu da carroça, e enquanto eu girava as rodas, ou
empurrava o carro, ela puxando a mula pelas rédeas estimulava o animal
oferecendo-lhe feno e cenouras.
Já próximos do Córrego, deixei-as ao Limite do Bosque com a orla do rio sob a
proteção oferecida pelas arvores, para que eu pudesse avaliar as possibilidades
de cruzarmos para a outra margem sobre um ponto raso e estreito, porém, o local
ao final da trilha era profundo e estava perigosamente agitado devido as chuvas
recentes... Voltando para junto de minhas Amadas, pedi-lhes que descessem
do carro, afim de esticarem as pernas, para que fizéssemos um lanche, e também
para que eu pudesse sair a percorrer a margem do rio em busca de um ponto de
fácil travessia.
Ao contrario de toda a agitação do Córrego o Bosque estava Bucólico e
Silencioso, e os Céus enchiam-se de nuvens novamente. Descarreguei o carro,
para que a pobre mula também tivesse seu descanso. Foi quando repentinamente,
Foxy levantara-se de orelhas arqueadas, farejando a toda volta, por fim começou
a rosnar, como que ante uma ameaça. Toda esta sua agitação deixava a mula
inquieta e assustada. Tive que usar de grande força para segurar as rédeas e
conduzir o carro até uma arvore para amarrar a agitada mula. Embora minha
atenção estivesse totalmente focada naquela situação, podia sentir a apreensão
de Viviam e o medo de Violett.
- Rafa! –Foi a única expressão de Vivian, antes de passar a acalmar a Soluçante
Violett.
Passado o primeiro Susto, de conter a mula, sobreveio o segundo... Foxy, ainda
agitada sobre o carro, começou a rosnar em Ameaça, fitando-me profundamente.
Foi quando avançou rapidamente, com grande Fúria. Sem tempo de defender-me
fechei os olhos à espera do Ataque, porém, eu não era seu alvo, Foxy no último
momento saltou sobre mim em direção às Profundezas do Bosque, e não havia como
impedi-la. A mula estava tremendamente assustada, pus a mão sobre seu dorso,
seu coração parecia a ponto de saltar para fora.
Quando de volta a Companhia de minhas Amadas, evitei por um certo Tempo falar
qualquer coisa, limitando-me a apenas sentar-me junto delas, tendo Violett
entre mim e Vivian. Acariciava os cabelo de suaves cachos de minha Adorável
filha, quando Vivian Beijou-me Ternamente. Eu precisava daquela Paz familiar.
Quando...
- Ela vai voltar papai. Ela foi brincar com seus amigos.
A Certeza com que Violett falara, chamou-me a Atenção para a maturidade com que
encarava o fato da partida de Foxy.
- Claro que sim meu bem. – Continuou Vivian. – Mas não podemos nos esquecer que
ela tem uma família também. E ela pode querer ir embora.
- Não mamãe. Ela gosta de mim, ela vai ficar... Ela só foi brincar. Ela me
disse.
Ouvindo a forma como minha Pequena falava, me trazia antigas duvidas à mente...
Mas se fossem como eu suspeitava, tudo já teria sido revelado, mas não. Eu
deveria me concentrar em nossa jornada.
- Rafa, temos que prosseguir, para que possamos voltar logo pra casa.
- Você esta certa. Vou encontrar um local para nossa travessia, e volto para
buscá-las. Temo que tenhamos de carregar todo o peso sem poder cruzar com o
carro.
Já havíamos perdido muito tempo, e este era um luxo do qual não podíamos nos
privar... Retomando o foco voltei ao Córrego, percorrendo sua margem e
seguindo seu curso. Ali, naquela área aberta podia-se ter uma maior ideia dos
estragos causados pela ultima tempestade, via-se galhos quebrados e troncos
partidos. Enquanto caminhava, levava comigo a sensação de estar sendo
observado, olhei para traz na esperança de ver minhas Amadas me observando ao
longe, mas não havia ninguém... Por vezes ouvia sons de galhos partindo e
pisadas fortes, vindos do interior do Denso Bosque, e por mais que eu
estreitasse os olhos a fim de aumentar o foco... Nada via, quando muito,
arbustos que sendo agitados, apontando a direção em que eu seguia. Gelei quando
do por entre os galhos, ouvia-se sons como que de luta, sons fortes, talvez
intensificados pela acústica, ou batalha travada entre animais de grande
porte...
Eu tinha de me apressar e encontrar logo um ponto em que pudesse a cruzar o
rio. Tentei atravessar sobre diferentes pontos, mas, com a forte correnteza,
não teríamos segurança alguma. Continuei a seguir o curso do rio por uma
acentuada curva em seu rumo, então voltei a ouvir “a luta”, quando sobreveio o
som de um tremendo urro, como de profunda dor... Naquele momento parei, para
que pudesse ouvir mais e melhor me preparar para uma possível e desagradável
surpresa... Mas, não havia nada, senão o alto som do rio. Continuei.
Tenho certeza de que não caminhara mais do que um longo quilometro, quando ouvi
o forte som, como o de uma grande tronco sendo partido, seguido de um “baque”
distante, então uma revoada se agitou e cruzou sobre mim. Também um outro som
veio até meus ouvidos, um som já familiar, vindo de mais a frente... Um Uivo,
possivelmente de Foxy, e mesmo que fosse, deveria me aproximar com cautela,
pois não sei como me receberia. A passos cautelosos me aproximei, percorrendo
uns sessenta metros até que melhor pudesse contemplar a Inacreditável Visão
diante de meus olhos...
Realmente era Foxy que eu ouvira Uivar, e estava visivelmente ferida, sentada
em “Sentinela” por sobre um grande tronco de arvore que caíra ligando as duas
margens do Córrego, sobre um ponto onde era mais largo, o que diminuía sua
agitação. O tronco como que uma barragem improvisada reduzia consideravelmente
o fluxo, possibilitando a travessia sobre uma área pedregosa, mantendo a água
ao nível de minha cintura. Agora era hora de voltar, com Foxy em meus braços e
buscar minhas Amadas, Esposa e Filha para que assim pudéssemos completar mais
esta tarefa em nossa jornada às cidades. E assim, com grande cansaço, mas
satisfação por conseguirmos, realizamos a travessia do córrego, estando muito
próximos do caminho de ligação do rio com a estrada das Cidades. Este Caminho,
ao contrario de nossa trila, era largo e limpo de entulhos, era costumeiramente
usado por pescadores e caçadores. Nesta margem, acredito que os perigos sejam
maiores, pois estaríamos cada vez mais próximos de “Civilidade”. Agora com
todos sobre o carro e com nossa mula descansada, avançávamos rapidamente,
enquanto minhas Amadas tratavam de nossa familiar ferida.